Três mil jovens se reúnem para dançar ao som de batidão no Rio de Janeiro até as 6h. Em São Paulo, música eletrônica bomba na pista agitando seis mil pessoas, a maior parte delas com idade entre 16 e 26 anos. As baladas investem também em funk, axé, hip hop, black music e forró. Tudo gospel. Versos como “Graça Maravilhosa” ou um remix de “Paz do Senhor” são entoados pelo público. Eles não rebolam até o chão, não ingerem álcool e, quando formam casais, não podem "se amassar" na pista. A ideia é curtir a noite sem ferir os preceitos cristãos.

Para beber, refrigerante, energético e coquetel sem álcool. Pegação, nem pensar. A equipe da chamada “Operação Desgrude” fica de olho nos casais mais assanhados. “Se beijar, a gente vai lá e separa.” conta o DJ Marcelo Araújo, do Ministério Voz de Deus. Pioneiro deste tipo de balada, ele organiza há 15 anos a Gospel Night, que acontece de três em três meses no Melo Tênis Clube, na Penha, zona norte do Rio de Janeiro. "A proposta é se divertir sem se corromper. Não se embebedar, não ter que dançar até o chão, nem ter que andar com roupa sensual para chamar a atenção de alguém e ter um encontro naquela noite. Não precisa ficar com 500 pessoas na noite só para se animar."

Passinho do Abençoado

O som é pop e não poupa ninguém. A banda de axé DOPA, por exemplo, foi fundada em 2007 e contou com a produção de um dos percussionistas de Ivete Sangalo. Músicos do Parangolé e Harmonia do Samba também já participaram das gravações do grupo. As letras, no entanto, têm sempre conteúdo religioso. O hit “Vai se converter” traz os versos “Tira onda de crentão/ quem vê pensa que ele é santo” e investe no refrão “Vá se converter/ senão o inimigo envergonha você”.

No funk, um dos hits é o “Passinho Abençoado”, de Tonzão, ex-integrante do grupo Os Havaianos, que aposta na versão gospel da dança: “O mistério é profundo/acho bom ficar ligado/quando ver o pretinho mandando/o passinho do abençoado. Qual é o cumprimento do crente? Paz do senhor”. No mesmo estilo, Adriano Gospel Funk fala de paquera: “A embalagem é bonita/ Mas tenho que analisar/ Se for de Deus, eu abraço/ Se não for, chuta que é laço”. O DJ Emerson MK, de Campo Grande, aposta no eletrônico como meio de conquistar a juventude. Um dos remixes do álbum recém-lançado “Jesus é Vida” traz entre as batidas uma forte crítica ao consumo de drogas ilícitas: “O diabo é maconheiro e o inferno é um gigantesco bagulho aceso.”

“DJ Pastor na área”

Além do cardápio musical gospel, mesa de bilhar, fliperama, torneio de basquete de rua e competição de videogame esquentam a noite na Comunidade Evangélica Crescendo na Graça, no Itaim Paulista, zona leste de São Paulo. Todo último sábado do mês, o DJ Pastor comanda as picapes há 13 anos, com uma coleção de canções que chega perto dos 4 mil hits nacionais e internacionais.

Quem criou a igreja há mais de dez anos foi o próprio DJ, que atende também por Anderson Dias Barbosa. Ele é de família evangélica, mas se afastou da vida religiosa na juventude justamente para poder sair para dançar. É isso o que ele oferece hoje.

O custo de R$ 5 ajuda a financiar o projeto Rei das Ruas, criado há três anos para ajudar no tratamento de dependentes de drogas que frequentavam a festa - e eram proibidos de consumir drogas no local. Segundo o pastor, mais da metade dos frequentadores não são evangélicos. "A balada não tem o intuito de convertê-los, mas de levá-los a pensar", diz ele.

“Em um determinado momento, tem uma palavra. ‘Olha bróder, vou falar para você hoje de uma parada, um cara que morreu por você, pela sua mãe’, e acaba atingindo um objetivo nosso que é fazer o cara refletir sobre a palavra de Deus”, conta Barbosa. Depois da pregação, a pista continua aquecida. A festa vai das 23h até as 4h. Para o ano que vem, o plano é organizar a primeira rave gospel, com 22 horas de som sem parar e criar a radioweb Balada Gospel.

Micareta gospel

É também uma igreja que abriga a maior balada gospel do Brasil. Seis mil pessoas participaram da Sky na sede da Renascer, na Mooca, zona leste de São Paulo. A festa rola há seis anos e também agita pistas de Jundiaí e Guarulhos há dois e pode ser levada para o Nordeste. A balada costuma contar com três bandas e tocar todos os estilos. “Nosso foco principal é trazer essa galera que não é evangélica para curtir o evento”, conta Alexandre Ricardo Pereira, um dos organizadores. Este junho deste ano, a Renascer organizou, também na sede da Mooca, a primeira Moocareta, uma micareta gospel que deve ter mais uma edição em 2014.

Críticas

Ainda que haja controle rígido em relação ao consumo de álcool e os próprios frequentadores evitem trajes e danças sensuais, este tipo de evento é alvo de críticas de grupos religiosos e fiéis tradicionais. “Há uma certa repressão. Tem pastores que proíbem os membros de participar”, diz Pereira. Ao ouvir uma crítica, o DJ Marcelo Araújo, do Ministério Voz de Deus, costuma convidar o autor para sua festa. “A gente encara a música como louvor a Deus. Eles passam a olhar com outros olhos quando ouvem as letras. Todas têm mensagens totalmente evangélicas”, conta o pastor Neto Marotti, baixista e líder da banda DOPA. “Vai pecar por quê?”, diz o hit “Quem Ama Espera”, parte da campanha da Renascer contra o sexo antes do casamento.

Fonte: Ig
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Eginoaldo

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